domingo, 23 de junho de 2013

Arena Pernambuco, mistério insondável no meio do nada

Celso de Campos Jr., do Recife
Arena Pernambuco, a 'Área 51' do Recife: longe dá órbita normal do morador da cidade
Arena Pernambuco, a 'Área 51' do Recife: longe da órbita normal do morador da cidade (Celso de Campos Jr.)
 
A imagem de milhares de torcedores deixando as dependências da nova arena na metade do segundo tempo de um clássico do futebol internacional para tentar – em vão, como se viu depois – evitar as aglomerações foi tão impressionante quanto sintomática
Em São Lourenço da Mata, o número 1 da rua Deus é Fiel não é uma igreja, um templo ou qualquer outro local sagrado. Neste endereço emblemático está erguida a Arena Pernambuco, que sediou no domingo seu primeiro jogo oficial, a partida de estreia das seleções de Espanha e Uruguai pela Copa das Confederações. Mesmo assim, quem decidiu se deslocar até o estádio já pagou, religiosamente, todos os seus pecados. No trajeto de ida, viagens de quase duas horas, pontuadas por trânsito, aperto e muitas filas; dentro da arena, desinformação, desabastecimento e mais filas; na volta, o caos total, com 40.000 pessoas retornando ao Recife ao mesmo tempo em uma combinação de estrutura deficiente com operação ineficaz. De todo esse furdunço, há um aspecto mais preocupante: se a operação da arena pode ser afinada com o passar do tempo, resolver os problemas de acesso a uma praça de esportes construída no meio do nada parece um sonho tão distante quanto o estádio.

Leia também:
Recife: muitos gastos, retorno baixo e imagem manchada
No caminho do torcedor até a arena, aperto e demora
Espanha passeia na Arena Pernambuco diante do Uruguai

A imagem de milhares de torcedores deixando as dependências da nova arena na metade do segundo tempo de um clássico do futebol internacional para tentar – em vão, como se viu depois – evitar as aglomerações foi tão impressionante quanto sintomática. Nesta segunda, o secretário extraordinário da Copa no Recife, Ricardo Leitão, empurrou para a Fifa, que determinou o fechamento do estacionamento do estádio, e para a Companhia Brasileira de Trens Urbanos, responsável pela operação do metrô, as dificuldades de mobilidade enfrentadas pelos torcedores. E confirmou que, para evitar atropelos semelhantes na partida desta quarta-feira, entre Itália e Japão, o governo de Pernambuco estuda decretar feriado no estado – uma assinatura definitiva no atestado de incompetência dos organizadores, incapazes de promover normalmente uma simples partida de futebol marcada há meses.

Leia também: 
Risco de greve expôs a fragilidade do acesso à arenaCalor e filas - de novo - na busca pelos ingressos no RecifeEnquanto o Brasil jogava, torcedor enfrentava as filas

De qualquer forma, nada disso resolve ou esclarece o mais insondável dos mistérios: por que gastar 532 milhões de reais para construir um estádio de 46.000 lugares a remotos 20 quilômetros da capital pernambucana, para o qual há apenas uma via de acesso, com somente duas pistas de tráfego? Na teoria, o estádio é parte de um complexo maior, denominado Cidade da Copa, que contaria com uma universidade federal e shopping center, entre outras atrações para alavancar o desenvolvimento da região. Mas, em Pernambuco, é grande a desconfiança sobre a efetiva concretização desse projeto. Por enquanto, a nova arena, com sua fachada arrojada e luminosa, segue aparecendo no horizonte de quem faz a viagem a São Lourenço da Mata como uma enorme construção futurista escondida no vazio – uma espécie de versão brasileira da famosa Área 51, a base secreta militar americana no deserto de Nevada que, especula-se, trata dos casos de extraterrestres e objetos voadores não identificados. A diferença é que, por aqui, é o bom senso que parece ter saído de órbita.


Nenhum comentário:

Postar um comentário